Dirigido por Joel Schumacher (do escrachado Batman & Robin) em 1990, Linha Mortal colocava os jovens Kiefer Sutherland, Julia Roberts eAlém da Morte Kevin Bacon como estudantes de Medicina que, fascinados por depoimentos de pessoas que passaram por Experiências de Quase Morte, resolvem simular o mesmo estado psicológico, pondo em risco não só as próprias vidas como também suas carreiras (que nem tiveram início).

Este remake (batizado no Brasil estranhamento como “Além da Morte”), pega a premissa original não para levantar questões interessantes ou aprofundar-se no tema, mas sim para construir uma trama rasa e que possibilite o susto fácil, abrindo mal até mesmo da atmosfera para tentar (sem sucesso) extrair os chamados “jump scares” (aqueles sustos que nos fazem pular da poltrona).

Tão decepcionante quanto o desperdício de uma boa premissa é o desperdício de um talento em potencial, no caso Ben Ripley, autor do inteligente roteiro de Contra o Tempo, mas que aqui não consegue reproduzir, nem de longe, a sagacidade que marcava aquela obra.

Após um prólogo levemente aleatório, a trama não demora a se concentrar no cotidiano dos jovens aprendizes de médicos, apresentando cenas de hospitais e com diálogos recheados de jargões, o que faz desse primeiro ato uma versão juvenil de E.R. (Plantão Médico), trazendo até mesmo uma ponta de Kiefer Sutherland, como um grisalho mentor que parece mais preocupado em emular o Dr. Gregory House do que qualquer outra coisa.

E se já no primeiro ato a produção mal conseguia se sustentar, ao apresentar os personagens centrais a narrativa começa a tropeçar em seus próprios passos, como por exemplo, ao tentar (desesperadamente) estabelecer uma ligação entre Courtney (Ellen Page) e Sophia (Kiersey Clemons), resultando numa troca tão frenética de informações expositivas que deixam o diálogo profundamente artificial.

Falando em artificialidade, o roteiro jamais consegue desenvolver seus personagens adequadamente, o que nos obriga a enxerga-los exatamente como aparentam ser: um grupo de estudantes ricos e desinteressantes com culpa no cartório que resolvem se entregar de forma estúpida e irresponsável a um experimento altamente arriscado.

Este longa, aliás, representa mais uma bola fora de Ellen Page (Juno), uma atriz respeitada e que um dia já chegou até mesmo a receber uma indicação ao Oscar. Aqui, Page arrisca seu prestígio ao encarnar uma protagonista que até nos envolve com sua energia, mas a solução tão trivial de seus conflitos dilui sua força, ao passo que Diego Luna até se esforça para conferir credibilidade a seu Ray, mas é igualmente sabotado pelo roteiro, ao mudar drasticamente suas atitudes de acordo com a demanda da história. Já Nina Dobrev (da série The Vampire Diaries) limita-se construir um estereótipo, enquanto o péssimo James Norton (de outra série, Black Mirror) nem isso é capaz de fazer.

Se o roteiro não diz muito a que veio, a direção do dinamarquês Niels Arden Oplev (do razoável Sem Perdão) demonstra uma tremenda falta de inspiração, o que fica claro depois da enésima vez em que algum personagem se assusta com o toque do celular.

Para completar, Oplev segue toda a cartilha de clichês, investindo em vultos que cruzam a tela, lanternas pouco eficazes, mãos em janelas, entre outros; tudo em prol de um terror que jamais se concretiza, já que não há preocupação em criar uma atmosfera, o que condena o projeto também como horror.

E se não funciona como drama, nem como terror, o mesmo acontece no campo da ficção científica, já que ninguém parece ter se importado em fornecer respostas plausíveis para toda a situação criada o que, mais uma vez, escancara a intenção da produção em buscar apenas os sustos fáceis, renegando qualquer grau de profundidade.

Menosprezando a inteligência do espectador ao desconfiar que seríamos capazes de entender sua “lição” (digna de um livro barato de autoajuda), o filme ainda se dá ao trabalho de colocar um personagem explicando o final, através de uma narração que surge implacavelmente do mais absoluto nada.

Apresentando ainda uma sequência de pesadelo terrivelmente concebida (uma personagem aparenta ter dormido enquanto usava o computador, mas acorda em um momento completamente diferente), Além da Morte é um filme que falha miseravelmente como drama, é ineficaz como terror e se leva a sério demais para poder funcionar como uma comédia, o que faz da experiência de assistí-lo algo enfadonho a ponto de fazer o público desejar uma Experiência de Quase Morte apenas para se livrar dela…

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Crítico de Cinema e Carioca. Apaixonado pela Sétima Arte, mas também aprecia uma boa música, faz maratona de séries, devora livros, e acompanha futebol. Meryl Streep e Arroz são paixões à parte...

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