Geralmente retratado como território hostil, o espaço sideral já foi palco de diversas histórias, desde epopéias como Star Wars e Star Trek, passando por tramas de Vidacunho filosófico e existencial como 2001 – Uma Odisséia no Espaço e Solaris e servindo como cenário de experiências que alimentavam o puro horror, como Alien – O Oitavo Passageiro. E ainda que continue rendendo obras de relevante valor artístico, como o recente (e excepcional) Gravidade, a verdade é que com a evolução da tecnologia, o espaço seja cada vez mais explorado pelo Cinema, o que pode acabar gerando besteiras colossais como Apolo 18: A Missão Proibida e A Caminho do Desconhecido. Vida, por outro lado, apresenta-se como um inofensivo meio-termo.

A trama nada mais é do que uma colcha de retalhos, que usa as virtudes, de alguns dos exemplares citados anteriormente, em prol de uma história que não tem muito a oferecer, além do tradicional escapismo que Hollywood é tão eficiente em proporcionar.

Não que isso seja um demérito, pois filmes como Eclipse Mortal e Europa Report estão aí para comprovar isso, mas às vezes a falta de empatia pode determinar o fracasso de um projeto.

E é exatamente esse o maior problema do roteiro escrito pela badalada dupla Rhett Reese e Paul Wernick (responsável pelos divertidos Zumbilândia e Deadpool), que parece não perceber que para envolver o público, é necessário criar personagens interessantes. E ver o filme tentar humanizar seus heróis, através de pequenos diálogos expositivos, só não é mais decepcionante do que testemunhar Jake Gyllenhaal atuar no piloto automático.

Vida

Capaz de criar figuras fascinantes como o ambicioso Louis Bloom de O Abutre ou o problemático protagonista de Donnie Darko, o ator Californiano limita-se ao básico em sua composição, transformando seu Dr. David Jordan numa figura unidimensional, que só desperta alguma simpatia por ser interpretado… por Jake Gyllenhaal.

E se a ótima Rebecca Ferguson (do mais recente Missão Impossível) tira leite de pedra como a líder da missão, Ariyon Bakare pouco consegue fazer com seu estereótipo de cientista. Já Ryan Reynolds surge numa contida e pequena participação como o alívio cômico do projeto, emprestando sua famosa persona irreverente a um astronauta que, assim como seus colegas, se entrega a súbitos arroubos de estupidez impulsiva.

Aliás, o maior mistério apresentado por Vida é como astronautas tão incompetentes conseguiram chegar ao espaço. Em certo momento, por exemplo, vemos três (sim, TRÊS) deles tentarem matar a criatura acionando os motores deliberadamente, desperdiçando combustível mesmo após ouvir um alerta. O que eles dizem após fracassar? “Ficamos sem combustível”.

Mas não para por aí, pois os três patetas ainda fazem questão de descreverem o óbvio, ao constatarem o crescimento da criatura: “Ele está bem maior!”. Mas o que esperar de uma produção cujo vilão parece ter saído do famoso “jogo da cobra” dos celulares antigos?

E por falar nele, um dos pontos altos do longa é justamente quando a trama faz uma pausa para comentar o fascínio da humanidade diante da possibilidade de contato com uma forma de vida extraterrestre. No entanto, se no início o tal alienígena até ganha o carinhoso nome de “Calvin”, rapidamente passa a ser comparado a Anthrax, em mais um exemplo da falta de sutileza do roteiro, que não se preocupa em construir essa mudança de perspectiva com o devido cuidado.

Felizmente, o cineasta sueco Daniel Espinosa (do bom Protegendo o Inimigo), consegue contornar as falhas de seu filme ao desviar a atenção do espectador para o clima tenso que a situação oferece. Sendo assim, Espinosa é relativamente eficaz ao criar uma atmosfera de suspense Vidaque é pontuada por cenas cujo impacto visual evidencia a surpreendente qualidade dos efeitos visuais do filme. Com isso, podemos até não dar a mínima para os personagens, mas nos preocupamos com o fato de que Calvin pode surgir a qualquer momento.

Fruto de um belo trabalho técnico, Calvin surge inicialmente como um singelo micro-organismo, conquistando simpatia em sua forma diminuta, mas sempre inspirando cautela à medida que cresce e vira uma mistura gelatinosa de alga-marinha com o Flubber  de Robin Williams. Inteligente e ameaçador, Calvin é um convincente “primo” do Alien, jamais deixando de parecer temível.

Além do clássico de Ridley Scott, a obra-prima de Stanley Kubrick também ecoa nas instalações da estação espacial, num trabalho burocrático, mas eficiente, de Nigel Phelps (Guerra Mundial Z).

Já a trilha sonora composta por Jan Ekstrand é clichê desde o primeiro acorde, cometendo o pecado de comentar cada cena e tentar conduzir as emoções do espectador.

Curto o bastante para não entediar, Vida é um filme que usa o suspense para compensar as falhas de seu roteiro, oferecendo como conseqüência, uma experiência tensa e ágil que quase nos faz esquecer da falta inteligência de seus personagens.

E quando se trata de astronautas da NASA, isso realmente importa…

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Crítico de Cinema e Carioca. Apaixonado pela Sétima Arte, mas também aprecia uma boa música, faz maratona de séries, devora livros, e acompanha futebol. Meryl Streep e Arroz são paixões à parte...

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